terça-feira, 30 de julho de 2013

O Homem Invisível - Parte 1

Houve uma época, quando era criança, que era um menino alegre, cheio de planos, idéias e sempre com um sorriso sincero. Hoje vivia a irrefutável rotina de seus dias, sem demonstrar qualquer tipo de emoção. Acordava cedo, tomava seu banho, escovava seus dentes e vestia-se para o trabalho, que exercia sem vontade numa empresa de artefatos de decoração. Quando entrou para a faculdade de publicidade, sonhava com grandes campanhas, comerciais de televisão e com seu maior desejo, o de entrar no mundo do cinema, mas agora não, ele nem se recordava disso, ou de como havia se tornado o homem que era. Uma sombra apática e miserável da sociedade da qual fazia parte, se é que fazia parte de alguma.

Como sempre, a segunda-feira havia começado igual a todas outras. Acordar cedo, banho, escovar os dentes e trabalho. Ele estava esperando o circular, como sempre fazia, para chegar à cidade vizinha aonde trabalhava, e que ficava a sete quilômetros de onde morava. Trajava sua velha jaqueta verde escura por cima da camiseta cinza, uma calça jeans, e seus cabelos estavam no estilo “moicano”, corte inclusive que se encaixava na atitude mais radical que tomara nos últimos doze anos. Ali estava ele, esperando como sempre, o inevitável desenrolar de mais um dia. O circular chegou e ele embarcou.

O percurso até seu trabalho não demorava mais do que quinze minutos. Ele preferia sentar a janela, pois descia na última parada da linha e assim não seria incomodado. Olhava compenetrado o mundo passar pela janela, sem de fato prestar atenção a nada, apenas absorto em pensamentos comuns e irrelevantes. Tão compenetrado, que não havia notado a mão que estava estendida a sua frente, e que o fez voltar de sobressalto a realidade. Um pacote de balas, sendo oferecido por uma linda moça. Cabelos loiros, sorriso cativante e um par de olhos azuis hipnotizantes. Não para ele. Ele não comia balas, mas aceitou para que logo pudesse voltar para seus pensamentos. Alguns minutos depois e, sua parada finalmente chegara. Levantou-se calmamente e dirigiu-se a porta de saída. A alguns passos de sair do ônibus, o motorista chamou sua atenção e lhe entregou um bilhete, dizendo que havia sido entregue pela mesma moça que antes havia lhe oferecido balas. O bilhete foi escrito em um recibo de mercado, no caso recibo este referente ao pacote de balas. Uma letra desenhada e formosamente alinhada dizia a seguinte frase: “Em 2 anos neste ônibus, nunca vi seu sorriso. Mesmo assim, têm noites em que sonho com ele!”. Ele colocou o bilhete no bolso e seguiu para o seu rotineiro dia. Sem mesmo sequer pensar sobre isso.

O dia havia sido cansativo, como todos os outros na vida dele. Sem grandes mudanças, além da marca de utensílios de higiene usados em sua empresa e a falta de bacon no seu “xis” diário, opção esta devido a uma gastrite recém adquirida. Olhou o noticiário sem prestar grande atenção aos fatos, comeu seu pão com manteiga e foi tomar seu banho antes de dormir. Após todo esse ritual que se repete todos os dias, da mesma forma que tantos outros rituais, ele deitou-se. Estava com sono, mas não conseguia dormir. Por mais que tentasse, se sentia incapaz disso. Não somente a noite havia caído lá fora, como também aquela frase escrita em um recibo havia caído agora em sua mente. Ele tentou dormir. Tentou evitar pensar nisso. Ele tentou, mas não conseguiu, e isto o deixou apavorado. Fazia anos que não sentia nada além de indiferença. Algo havia mexido com ele, e ele precisava descobrir. Ele precisava encontrar aquela moça. Seria a primeira coisa que faria pela manhã!


Continua...

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